Pessimismo confunde o povo: “falsa ideia de que o mundo vai mal”

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Por Só Notícia Boa
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Foto: Pixabay|Steven Pinker - Foto: Chona Kasinger / NYT

O “populismo se nutre da falsa ideia de que mundo vai mal”. É preciso lutar contra o pessimismo e divulgar o progresso da humanidade para corrigir uma visão distorcida que as pessoas têm do mundo.

É o que pensa o psicólogo e linguista canadense-americano Steven Pinker, professor de psicologia da Universidade de Harvard. Ele persiste na cruzada para nos convencer de que o mundo nunca esteve tão bem, apesar das guerras, refugiados e atentados.

Para evitar que as pessoas sejam seduzidas pelo discurso catastrofista nostálgico do populismo em expansão, o psicólogo cognitivo defende que é preciso redobrar o foco na razão, na ciência, no humanismo e no progresso para que as coisas continuem a melhorar.

Em seu livro mais recente, “O Novo Iluminismo – Em defesa da razão, da ciência e do humanismo”, lançado no Brasil na quinta, dia 6, pela Companhia das Letras, Steven Pinker, 63, retoma o projeto de mostrar com dados e fatos que as coisas estão melhorando.

Em entrevista à Folha ele falou sobre como o noticiário influencia a cabeça das pessoas a achar que tudo vai mal. A gente reproduz parte do que ele disse abaixo:

Influência do noticiário

“Isso decorre da natureza do noticiário e da mente humana. A mente humana avalia risco e perigo por meio de exemplos vívidos, imagens, narrativas”.

“Se lemos uma reportagem marcante sobre alguém sendo mordido por um tubarão, um terrorista jogando seu carro no meio das pessoas na calçada, ou um ataque numa guerra, isso nos faz pensar que esse tipo de incidente é extremamente comum.

“Nós conseguimos nos lembrar facilmente do que está mais disponível na nossa memória, algo que os psicólogos chamam isso de heurística da disponibilidade. Quanto mais alguma coisa está à mão na nossa memória, mais pensamos que é algo com grande probabilidade de acontecer”.

Já o noticiário tem como objetivo apresentar ao público eventos e incidentes. Se qualquer coisa ruim acontece em qualquer lugar do mundo, é garantido que estará no noticiário. Já os acontecimentos positivos muitas vezes não rendem imagens vívidas, e na maioria das vezes não são coisas que acontecem de repente, portanto eles sistematicamente não estão no noticiário.”

Notícias boas

Veja o que ele diz sobre a falta de notícia boa na mídia:

Não se noticia o fato de que, nos últimos 40 anos, não houve nenhuma guerra no sudeste da Ásia, uma região onde frequentemente havia conflitos, como o da Coreia, Camboja, Vietnã. Uma região onde não há guerra não é uma manchete, esses são acontecimentos que só podem ser vistos por meio de dados.

Só quando você compila dados, como eu fiz, é que consegue compreender as enormes mudanças benéficas que ocorreram no mundo.

Por exemplo, mortes em guerras: o número de mortes aumentou um pouco nos últimos cinco anos, por causa da guerra da Síria, mas, mesmo assim, está muito abaixo dos níveis dos anos 50, 60 e 70, e mais ainda dos níveis da Segunda Guerra Mundial (1939-45).

Da mesma maneira, os jornais raramente falam que a porcentagem da população vivendo em pobreza extrema caiu de 30% há 30 anos para 10%; e alfabetização aumentou para 90% das pessoas com menos de 25 anos.

Na maioria dos países, a criminalidade caiu. Até no Brasil, um dos mais violentos, houve queda no número de mortes decorrentes de crimes em algumas cidades, como o Rio.

Melhoras que podem ser detectadas nos números, nos dados, quase nunca aparecem no noticiário, por isso as pessoas não sabem que houve progresso.

Quando elas [as pessoas] veem dados, elas ficam surpresas e mais receptivas.

Algumas pessoas estão dispostas a aprender, duvidar de suas intuições e essas pessoas podem usar esses dados para repensar suas crenças. Isso pode motivar pessoas que são comunicadores eficientes a usar fatos positivos para se contrapor à narrativa populista.

Não deveríamos combater a propaganda com propaganda, mas propaganda amparada em fatos vale a pena espalhar.

Steven Pinker - Foto: Chona Kasinger / NYT

Steven Pinker – Foto: Chona Kasinger / NYT

A força do ruim

Há estudos bem conhecidos mostrando que o ruim é mais forte que o bom; do ponto de vista psicológico, estamos mais preocupados com o que pode dar errado do que com o que pode dar certo.

Em geral, acontecimentos negativos deixam um impacto psicológico maior. E isso tem mais uma consequência: normalmente, levamos muito mais a sério as pessoas que nos alertam para o que pode dar errado do que as pessoas que identificam o que está dando certo.

É aquele ditado: sempre parece que os pessimistas querem nos ajudar, enquanto os otimistas querem nos vender alguma coisa.

Humanismo

Ciência é a aplicação da razão ao mundo natural.

Humanismo é o princípio de que é o bem estar dos seres vivos que é o maior valor moral, e não a glória de uma tribo, nação, ou lei religiosa. E progresso é usarmos razão e ciência para alcançarmos o bem estar dos seres vivo.

Isso não significa que teremos um mundo perfeito, isso é impossível, mas pode, sim, haver uma melhora gradual.

Iluminismo

Steven Pinker acredita no Iluminismo, movimento que surgiu durante o século XVIII na Europa, que defendia o uso da razão (luz) contra o antigo regime (trevas) e pregava maior liberdade econômica e política, movimento que promoveu mudanças políticas, econômicas e sociais, baseadas nos ideais de liberdade, igualdade e fraternidade.

“O progresso não é automático, nem inevitável, ele depende dos ideais do iluminismo. Portanto, se um movimento contra o iluminismo se torna dominante, isso pode desacelerar o progresso ou levar a retrocesso”, diz.

Já houve várias fases de retrocesso na história, por exemplo, durante a ascensão do fascismo nos anos 30 e 40, que levou o mundo a se voltar contra a democracia liberal.

No livro, eu discuto como os movimentos atuais contra o iluminismo são uma continuação de movimentos do século 19 que glorificavam nação, raça ou religião, em vez de focar os indivíduos, e que olhavam para o passado como uma era de ouro em vez de tentar resolver problemas e fazer um futuro melhor que o presente.

Igualdade

Política identitária é uma teoria de que a humanidade é dividida em grupos baseados em raça, gênero, e orientação sexual, que sempre estão brigando por poder.

É a teoria de que precisamos lutar para que um grupo tenha menos poder, para que o outro possa ter mais.

É errado discriminar alguém por causa de raça ou gênero, é errado tentar virar a mesa e fazer outra raça ou gênero superior. Igualdade significa que todos têm direitos iguais, independentemente de raça, gênero ou orientação sexual.

Usar políticas raciais acabaria discriminando contra alguns indivíduos, e isso geraria ressentimento e reação —que é o que estamos vivendo nos EUA hoje.

Sou a favor de políticas que tentam ajudar os mais pobres, como tributação progressiva, mas apenas quando o objetivo é melhorar a vida dessas pessoas, e não igualar a vida de todo mundo.

Populismo autoritário

O mundo precisa de uma narrativa que se contraponha ao populismo autoritário.

As pessoas não valorizam as conquistas da democracia liberal, não há muita gente disposta a defendê-las.

Há pessoas carismáticas e apaixonadas defendendo o populismo autoritário e a religião, mas o projeto iluminista carece de defensores. Não sou um líder carismático, mas espero dar munição e argumentos para pessoas que possam ser.

Vivemos em uma era em que é possível acessar dados que costumavam ser obscuros e difíceis de encontrar, então podemos documentar o progresso e isso muda nossa compreensão das coisas.

Com informações da Folha