Uso de amianto está proibido no Brasil, decide STF

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Por Só Notícia Boa
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Fotos: MP do Trabalho / Wilson Dias/Arquivo Agência Brasil

O  STF, Supremo Tribunal Federal, proibiu todos os tipos de amianto no Brasil: desde a extração e industrialização até a comercialização e distribuição.

A decisão, tomada nesta quarta, 29, encerra um longo debate jurídico sobre o material, comum em telhados do Brasil – em telhas e caixas d’água. O amianto tem fragmentos, facilmente inaláveis, que podem liberar no ambiente elementos que provocam câncer.

No julgamento, os ministros do STF declararam inconstitucional o artigo de uma lei federal que autorizava o amianto do tipo crisotila – outro tipo, o anfibólio, já era proibido desde 1995.

Os ministros já haviam se posicionado contra os interesses da indústria do amianto em agosto, mas agora a decisão tem efeito vinculante. Ou seja, tribunais são orientados a seguir a posição da Corte em ações semelhantes.

“A utilização do amianto ofende postulados constitucionais e, por isso, não pode ser objeto de normas autorizativas”, declarou o ministro Celso de Mello, em referência aos artigos que protegem a saúde do cidadão e o meio ambiente.

“Foi um dia muito especial. Há tanto tempo nós esperamos por isso. Estou recebendo ligações de familiares de vítimas, confortados de que foi reconhecida a gravidade do amianto”, afirmou a ex-auditora do Ministério Público do Trabalho Fernanda Giannasi, que atuou em fiscalizações na indústria do amianto por 30 anos.

“Essa decisão vai ter impacto no mercado global, vai ser um efeito dominó. Se um país produtor, como o Brasil, é capaz de tomar uma decisão dessas, por que não seria seguido por aqueles países que só compram o amianto?”, questiona Giannasi.

“Não há a menor possibilidade de que uma lei estadual permitindo o amianto possa ser declarada constitucional. Se havia alguma dúvida no julgamento anterior, agora não há mais”, comenta Mauro Menezes, advogado da associação dos expostos ao amianto.

“A proibição de utilização de qualquer forma de amianto, em qualquer lugar do Brasil, fica impregnada nos votos dos ministros”.

O outro lado

Já representantes da cadeia do amianto argumentaram que a decisão significaria a demisão de centenas de trabalhadores. Afirmavam também que interromper a mineração abruptamente, ao sabor da decisão judicial, não seria simples. O berço do amianto brasileiro é a pequena cidade de Minaçu, norte de Goiás.

O prefeito da cidade, Agenor Nick Barbosa (DEM), soube do resultado do julgamento pela reportagem da BBC Brasil.

“Se a proibição acontecer mesmo, será a pior coisa para Minaçu. Aqui, 60% da arrecadação da Prefeitura vem do amianto. Vamos perder uma renda absurda, vai ser um acontecimento catastrófico. Somos uma cidade com 31 mil habitantes, aqui não tem agricultura, pecuária, nada. Vamos ter que começar do zero. Era preciso ter um período de transição, para o município se preparar”, lamentou.

A BBC Brasil não conseguiu falar com o Instituto Brasileiro do Crisotila.

Estados se adiantaram

Alguns Estados e municípios já haviam banido todas as formas de amianto porque consideram inseguro todo tipo de manipulação do material. É o caso de São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Pernambuco.

A maioria das ações analisadas no STF haviam sido propostas pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria (CNTI), que se opõe à proibição imposta por leis estaduais.

O argumento, derrubado pelo STF, era de que os Estados não poderiam legislar sobre esse tema.

O amianto

O amianto é uma fibra mineral sedosa. Ele é usado principalmente na fabricação de telhas e largamente empregado em residências populares.

O setor do amianto calcula que metade das casas brasileiras tenham telhas de amianto. O país está entre os três maiores produtores do mundo.

Em agosto, poucos dias antes da retomada do julgamento, o Ministério Público do Trabalho (MPT) flagrou diversas telhas quebradas, envoltas em poeira, em uma fábrica da Bahia.

Nelas, ainda era possível ler a inscrição obrigatória: “Contém amianto: ao cortar ou furar, não respire a poeira gerada, pois pode prejudicar gravemente a saúde”. A imagem, fotografada em 2 de agosto, é a prova de uma irregularidade, segundo o órgão.

“Hoje, o que se observa é um consenso em torno da natureza altamente cancerígena do mineral e da inviabilidade de seu uso de forma efetivamente segura”, disse em sessão prévia o ministro do STF Dias Toffoli.

Por um lado, organizações de saúde pública, como o Instituto Nacional de Câncer e a Fundação Oswaldo Cruz, propagam os riscos para a saúde em decorrência da exploração do amianto.

Em 61 países, o uso do material já foi banido, justamente pela falta de segurança.

Já a cadeia do amianto afirma que a variedade produzida no Brasil oferece menos riscos e é trabalhada com alto padrão de segurança. O argumento é de que uma proibição à produção e comercialização traria sérios prejuízos.

“A decisão a ser tomada pelo STF terá enorme impacto sobre uma atividade que envolve 170 mil empregos, diretos e indiretos, em todo o território nacional”, afirmou em nota o Instituto Brasileiro do Crisotila, um dos subtipos de amianto, em agosto.

Câncer

A Agência Internacional de Pesquisa sobre o Câncer (Iarc, na sigla em inglês), ligada à Organização Mundial de Saúde (OMS), afirma que “todas as formas de amianto são cancerígenas”.

O principal câncer relacionado ao amianto é o mesotelioma, que acomete membranas que revestem órgãos como o pulmão.

É uma doença rara, que pode demorar até 40 anos para se manifestar a partir da exposição ao amianto e que mata em cerca de um ano.

O diagnóstico é muito difícil. Entre 1980 a 2010, ocorreram 3,7 mil mortes por mesotelioma no Brasil, segundo estudo do médico sanitarista Francisco Pedra, da Fiocruz.

Além disso, a Iarc também relaciona o amianto a câncer de pulmão, laringe e ovário.

“Essa agência da OMS faz um levantamento de todos os artigos científicos existentes. Quando atesta que um agente é cancerígeno, é porque existem evidências científicas consistentes”, aponta Ubirani Otero, epidemiologista do Instituto Nacional de Câncer (Inca), ligado ao Ministério da Saúde.

Além de câncer, o amianto é relacionado à asbestose, uma doença que pode provocar enrijecimento no pulmão e dificuldade respiratória.

Outros países

França, Alemanha, Inglaterra, Itália, Espanha, Portugal, Japão, Austrália estão entre os países que baniram a substância.

Vizinhos sul-americanos do Brasil também estão na lista: Argentina, Chile, Uruguai. Por outro lado, há quem permita o mineral, como Estados Unidos e Canadá.

Com informações da BBC