Ex-catador de lixo já trabalha como médico

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Por Bruno M.
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Foto: Cícero Pereira/Arquivo Pessoal
O ex-catador de lixo que se formou em medicina – mostrado em junho aqui no SóNotíciaBoa – já está trabalhando como médico clínico e generalista em dois hospitais: de Águas Lindas e Valparaíso, municípios no Entorno do DF.
Exemplo de determinação, dedicação e superação, o Dr. Cícero Pereira Batista hoje está se vendo do outro lado da mesa.
Ele enxerga em muitos pacientes um quadro semelhante ao que viveu nas ruas.

“São iguais a mim. São pessoas que muitas vezes chegam com fome, chegam doentes porque não tiveram o que comer”.

A experiência dura na infância ajuda Cícero a cumprir o que considera uma missão: “O médico muitas vezes tem essa autonomia de aliviar o sofrimento. Eu me formei em medicina para aliviar o sofrimento de pessoas que estavam como eu.”

Livros do lixo
Órfão de pai aos 2 anos e tendo a mãe alcoólatra e um dos sete irmãos traficante, o médico, de 33 anos, conseguiu vencer as adversidades estudando com livros que retirava do lixo.

Ainda criança, ele saía do Chaparral, onde a família mora até hoje, e percorria 20 quilômetros todos os dias pelas ruas de Taguatinga – a 25 km de Brasília – em busca de comida.

“Meu pai era quem fazia o sustento de casa, e morreu de uma úlcera que provocou hemorragia interna. Minha mãe ficou louca e bebia muito. Ela começou a lavar roupa para fora e a catar latinha no meio da rua, mas não era suficiente. A gente sempre passou fome, tudo o que ela fazia não dava jeito. E meu irmão levava traficante para a nossa casa. Aliados a nossa miséria, tínhamos o alcoolismo e as drogas dentro de casa. Eu saía para buscar comida – a gente não tinha mesmo, não tinha nem o que vestir – e tinha dias que não voltava. Eu não precisava, mas tinha dias que dormia na rua para não ter que aguentar as brigas”, lembra.

Junto com as sobras de alimentos descartados no lixo, Batista recolhia todos os livros que encontrava e discos de Beethoven e Bach, atualmente suas inspirações. 

“Às vezes eu pensava, vendo a vida dos compositores, que se Bethoven era surdo e fez o que fez, eu não poderia tentar?
Eu, mesmo com fome, mesmo com adversidades, pobre, negro, não sendo homem bonito, conseguiria chegar lá. E é isso que a gente tem que pensar, que todo esforço é poder.”

A subida
A inspiração o levou a fazer um teste para o curso profissionalizante de técnico de enfermagem, que valia como ensino médio. O jovem foi aprovado em segundo lugar na seleção.

Após concluir os estudos, Cícero decidiu então prestar concurso e passou a trabalhar na Secretaria de Saúde.

O pouco dinheiro já era um alívio diante das dificuldades vividas pela família, mas o rapaz queria mais.

Três anos depois, fez vestibular para medicina em uma faculdade particular no interior de Minas Gerais, passou e, sem pensar duas vezes, decidiu enfrentar o novo desafio.

Em 2008 ele conquistou uma bolsa integral em Brasília, onde se formou médico este ano.

Futuro
Além de continuar prestando atendimento a quem vive em situação de vulnerabilidade social, o médico quer abrir um consultório particular na capital do país e acumula os sonhos de fazer residência em psiquiatria e especialização em medicina aeroespacial fora do Brasil.

O próximo passo será dar uma casa nova para a mãe dele.

“Minha mãe está velhinha e precisa de um mínimo de conforto e paz. Ela cuidou de muitos filhos, já está na hora de eu cuidar dela agora que eu me formei médico. Não quero que ela passe fome de novo, não quero que ela viva em uma casa com goteiras e mofo. Esses últimos ideais são meus sonhos de realização imediata e necessária”, afirmou.

Com informações do G1