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Ela dá aulas de natação de graça para formar cidadãos na BA

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26 / 03 / 2018 às 00 : 00
Foto: Lorena Vinturini|Peixinho dá aulas em Porto da Barra BA Foto: Lorena Vinturini
Foto: Lorena Vinturini|Peixinho dá aulas em Porto da Barra BA Foto: Lorena Vinturini

Uma professora de natação dá aulas de graça em uma praia da Bahia de Todos os Santos para formar cidadãos.

Sulamita Araújo, de 52 anos, ensina natação há 17 anos crianças para jovens e adultos,  seis vezes por semana (às vezes sete) em Porto da Barra.

Atualmente, são 105 alunos na Escola Peixinho Porto da Barra. Desse total, 70 não pagam a mensalidade de R$ 250.

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São crianças e adolescentes cujos pais não podem arcar com aulas de natação, ou até mesmo adultos que trabalham, mas não poderiam encaixar as braçadas no orçamento.

Além de tudo isso, a “Peixinho” como é conhecida, ainda mantém um projeto social com natação no Rio de Janeiro.

Também no Rio, organiza viagens para provas de maratona aquática, especialmente a Travessia dos Fortes e a Rei e Rainha do Mar.

Os alunos que podem, arcam com seus custos de inscrição, passagens, hospedagem e alimentação. Para os que não conseguem, entra a Peixinho.

“Ela é uma dessas pessoas que a gente encontra no Brasil e que deveria ser um espelho, como professora de natação e como educadora física. Ela se sacrifica, se dedica ao coletivo. Nós só podemos aplaudir”, afirma Luiz Lima, ex-nadador profissional com participação em duas olimpíadas, Atlanta 1996 e Sydney 2000.

“Não é só assistência social. Ela usa a natação para formar cidadãos e ainda dá a oportunidade a quem quiser progredir enquanto atleta, botando pra competir”, observa.

Como

Para conseguir bancar os custos das aulas, dos materiais e das viagens dos alunos – e pagar as próprias contas – Peixinho dispõe de um leque variado de rendas, cujos valores prefere não revelar.

Além das mensalidades de quem paga pela natação na praia, ela dá aulas na piscina de um condomínio próximo ao Porto, realiza recreação em festas infantis e faz sessões de massagem watsu, uma técnica de relaxamento executada, é claro, na água.

Seus dias, entretanto, são prioritariamente no Porto, onde dá aulas de manhã, à tarde e à noite.

“Ela não descansa, não tem férias nem folga. Desce pra praia no sol, na chuva, com trovoada, desce até com dor de dente. Só tem dois dias do ano que ela não dá aula: Natal e 1º de janeiro, que é o aniversário dela. Mesmo assim, não duvido que ela desça se aparecer um aluno”, diz Priscila Jatobá, que nada com Peixinho há 10 anos e hoje auxilia na gestão da escola.

Família

Ela tem duas justificativas pessoais para sua dedicação. De um lado, sente que tem obrigação de passar para os alunos aquilo que recebeu dos seus professores ao longo da vida.

A segunda razão ela revela em meio a um emocionado pranto: “Nunca tive afeto na minha família. Fui abusada por meu pai, minha mãe não me dava carinho e fui me afastando dos meus irmãos. Eu sempre sofri com essa carência e tento dar aos meus alunos aquilo que sempre quis ter”.

Entre alunos e ex-alunos de Peixinho, a ideia de família é recorrente.

“Tia Peixinho é como uma mãe pra mim. A gente nunca teve patrocínio, mas nunca deixou de competir e de viajar. A gente vendia rifa pra ajudar a pagar tudo”, conta Jardel de Souza, de 21 anos, nadando há 15 com Peixinho sem nunca ter pago mensalidade. Para ele, a natação virou sustento. Hoje, Jardel é salva-vidas num resort no Litoral Norte da Bahia.

Trajetória

Sulamita começou a se tornar Peixinho muito cedo. Nascida no apartamento em que mora até hoje, suas primeiras lembranças remetem ao Porto da Barra.

“Com 4 anos, eu estava nas pedras e uma tia começou a se afogar. Eu entrei com uma boia dessas de câmara de pneu de caminhão e trouxe ela pra areia”, conta.

Então, começou a nadar num clube perto dali, que já nem existe mais. Pequena, magra e veloz, foi apelidada de “Pititinga” pelo primeiro treinador.

Mas, aos 5 anos, mudou de clube, de treinador e de apelido. Na primeira competição nacional, ganhou duas medalhas de ouro. Virou Peixinho.

Foram muitas medalhas e recordes, dos quais ela lembra sem modéstia e com alguma mágoa. “Fui a melhor nadadora da Bahia, mas não tinha nome nem apoio da família.”

Professora

Aos 14 anos, começou a se afastar das competições e, aos 18, virou assistente das aulas de natação infantil de um clube.

“Foi quando descobri o que queria ser: professora. Pra mim, meus alunos são como meus filhos.”

Nos anos seguintes, Peixinho passou por quase todos os clubes e academias da capital baiana, à frente de escolinhas de natação ou comandando equipes competitivas.

Aos 32, depois de idas e vindas, concluiu o curso de Educação Física.

Em 2001, virou sócia de um espaço de natação. Ali, uma mulher chegou com o filho – que tinha paralisia cerebral – e afirmou não ter dinheiro para as mensalidades do garoto.

“Eu queria botar a criança na água, mas meu sócio não aceitou. Em um mês, saí da sociedade no prejuízo, mas não dava pra mim.”

Adepta do candomblé e filha de Iemanjá, Peixinho afirma lembrar do momento em que definiu seu destino.

“Cheguei aqui no Porto e fiquei pensando, meditando. Foi como se minha mãe Iemanjá me dissesse: faça sua escola aqui.”

Desde então, são 17 anos sem férias, mas de boas histórias. Sem precisão na contagem, ela estima que mais de 2 mil pessoas já passaram por suas aulas na praia, sempre com uma média de 70% de gratuidade.

“Não tem nada a ver com dinheiro. Muitas vezes eu fico endividada, outro dia estava com R$ 12 mil negativo no banco, mas o dinheiro volta, os alunos que podem ajudam e assim a gente segue. Minha maior conquista é ver meus alunos felizes”, conclui.

Peixinho dá aulas em Porto da Barra BA Foto: Lorena Vinturini
Peixinho dá aulas em Porto da Barra BA Foto: Lorena Vinturini

Com informações da BBC

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