Sangue menstrual tem células-tronco que podem tratar diversas doenças humanas

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Por Rinaldo de Oliveira
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As células-tronco encontradas no sangue menstrual e no endométrio são poderosas e podem ser usadas na medicina regenerativa - Foto: Silvia / Pixabay

O sangue menstrual é muito mais rico do que se imagina. Ele tem células-tronco potentes que podem ser usadas para tratamentos terapêuticos de várias doenças e problemas do corpo humano, na chamada medicina regenerativa.

Pesquisas feitas com roedores descobriram que a injeção de células estaminais menstruais no sangue pode curar feridas, estimular a produção de insulina em diabéticos, reparar o endométrio danificado, melhorar a fertilidade, e tratar doenças ginecológicas.

Mais que isso: elas também podem ser transplantadas em humanos sem efeitos colaterais adversos. A bióloga Caroline Gargett, da Universidade Monash, na Austrália, estuda as células-troncos menstruais há 20 anos.

Terapias humanas

Agora, a equipe de Gargett está tentando desenvolver terapias humanas com as células-tronco encontradas.

Ela e os seus colegas estão usando células estaminais endometriais – aquelas retiradas diretamente do tecido endometrial, em vez do sangue menstrual – para conceber uma malha biodegradável para tratar o prolapso de órgãos pélvicos, uma condição dolorosa comum que é frequentemente causada pelo parto.

Apesar da conveniência de coletar células-tronco adultas multipotentes do sangue menstrual, a pesquisa que explora e utiliza o poder das células-tronco – e seu papel potencial nas doenças – ainda representa uma pequena fração da pesquisa com células-tronco, diz Daniela Tonelli Manica, antropóloga que lidera estudos no Universidade Estadual de Campinas, em São Paulo.

Como descobriram

Antes que ela pudesse afirmar que as células eram verdadeiramente células-tronco, Gargett e sua equipe da Universidade Monash tiveram que submetê-las a uma série de testes rigorosos.

Primeiro, mediram a capacidade das células de proliferarem e se auto-renovarem, e descobriram que algumas delas podiam dividir-se em cerca de 100 células no espaço de uma semana.

Eles também mostraram que as células poderiam de fato se diferenciar em tecido endometrial e identificaram certas proteínas reveladoras que estão presentes em outros tipos de células-tronco.

Células multipotentes

Gargett, que agora também trabalha no Hudson Institute of Medical Research, e seus colegas estudaram vários tipos de células auto-renováveis no endométrio, o tecido que reveste a parte interna do útero.

Mas apenas as células bigodes, chamadas células estaminais mesenquimais do estroma endometrial, eram verdadeiramente “multipotentes”, com a capacidade de serem persuadidas a tornarem-se células adiposas, células ósseas ou mesmo células musculares lisas encontradas em órgãos como o coração.

Na mesma época, duas equipes de pesquisa independentes fizeram outra descoberta surpreendente: algumas células-tronco mesenquimais do estroma endometrial puderam ser encontradas no sangue menstrual.

Por que o corpo elimina então?

Gargett ficou surpresa com o fato de o corpo se livrar tão facilmente de suas preciosas células-tronco.

Como elas são tão importantes para a sobrevivência e o funcionamento dos órgãos, ela não achava que o corpo iria “desperdiçá-los” ao se livrar deles.

Mas a cientista também reconheceu a importância da descoberta: em vez de depender de uma biópsia cirúrgica invasiva para obter as células-tronco indescritíveis que identificou no endométrio, ela poderia coletá-las através do copo menstrual.

20 anos de estudo

Há cerca de 20 anos, a bióloga Caroline Gargett procurou algumas células notáveis em tecidos que haviam sido removidos durante cirurgias de histerectomia – remoção do útero.

As células vieram do endométrio, que reveste o interior do útero.

Quando Gargett cultivou as células em uma placa de Petri ela viu o que procurava: dois tipos de células, uma plana e arredondada, a outra alongada e afilada, com saliências semelhantes a bigodes.

Gargett suspeitava fortemente que as células eram células-tronco adultas – células raras, altamente valorizadas e auto-renováveis, algumas das quais podem se tornar muitos tipos diferentes de tecidos.

Suspeitas confirmadas

Ela e outros pesquisadores há muito levantavam a hipótese de que o endométrio continha células-tronco, dada a sua notável capacidade de crescer novamente a cada mês.

O tecido, que fornece um local para a implantação de um embrião durante a gravidez e é eliminado durante a menstruação, passa por cerca de 400 ciclos de eliminação e crescimento antes que a mulher chegue à menopausa.

Mas embora os cientistas tenham isolado células estaminais adultas de muitos outros tecidos em regeneração – incluindo a medula óssea, o coração e os músculos – “ninguém tinha identificado células estaminais adultas no endométrio”, diz Gargett.

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Enroladas aos vasos sanguíneos

A equipe de Gargett descobriu que essas células-tronco especiais estão presentes nas camadas inferior e superior do endométrio.

As células são normalmente enroladas em torno dos vasos sanguíneos em forma de meia-lua, onde se acredita que ajudam a estimular a formação de vasos e desempenham um papel vital na reparação e regeneração da camada superior de tecido que se desprende a cada mês durante a menstruação.

Esta camada é crucial para a gravidez, fornecendo suporte e nutrição para o embrião em desenvolvimento.

A camada e as células estaminais endometriais que estimulam o seu crescimento também parecem desempenhar um papel importante na infertilidade: um embrião não pode implantar-se se a camada não engrossar o suficiente.

Medicina regenerativa

Mas ela e outras pessoas transformaram a menstruação numa nova e excitante fronteira na medicina regenerativa; não é mais apenas um inconveniente mensal.

Este artigo foi publicado originalmente na Knowable Magazine, uma publicação sem fins lucrativos dedicada a tornar o conhecimento científico acessível a todos.

A autora, Sneha Khedkar, é bióloga e ex-pesquisadora que se tornou jornalista científica freelance em Bengaluru, Índia.

As bolhas roxas são clones das células-tronco que Caroline Gargett e colegas identificaram no fluido menstrual - CRÉDITO: K. SCHWAB, C. TAN e C. GARGETT, The Ritchie Center, Hudson Institute of Medical Research e Monash University Department of Obstetrics and Gynecology em Melbourne

As bolhas roxas são clones das células-tronco que Caroline Gargett e colegas identificaram no sangue menstrual – CRÉDITO: K. SCHWAB, C. TAN e C. GARGETT, The Ritchie Center, Hudson Institute of Medical Research e Monash University Department of Obstetrics and Gynecology em Melbourne

Com informações do GNN